27/11/2010

Em adolescente, eu...

... escrevia coisas do coração... (nada entitulado)


"Corpo interior
alma escondida
que guarda o veneno
do cigarro e da bebida

Prato de porcelana
em lua cheia perambula.
Será alma morta
que vive de sonho?

Tudo é branco
como o doce gosto do perfume
das rosas.
Aura que nunca morre"

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"Cárcere da solidão,
homem de dinheiro,
sonhador desiludido,
patriarca sem filhos.

Criador inesgotável,
pobre alma.
Conquistador inveterado,
pausa das decisões.

Criatura mercenária,
vivente de seu mundo,
camponês da metrópole, distante de todos.
É pai."

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"Em meio à neblina,
incessante tempestade o fere.
Todos daquele lugar lhe dão as costas,
não tem para onde fugir e
seus olhos cegam com a luz dos relâmpagos.
Fica, então, deitado sobre a grama
e sob a água que vem dos céus e o afoga.
Sente-se desmoronado.
Levanta-se humildemente e olha pra trás,
percebe quantos fantasmas
ficaram e lamenta-se. Então,
vira-se para o horizonte,
a tempestade parece não ter fim,
a força da água desvastadora
engole seu coração.
Quase não possui aquilo
que se chama amar. Sente rancor.
Caminha contra a
terrível enxurrada que o abate,
cada pingo d'água, uma lágrima.
Aguenta firmemente,
apesar das feridas e da dor. Um herói.
Quem dera fosse no pain, ninguém é.
Agora, passa pelo maior dos obstáculos
e consegue enxergar à sua frente diversos deles,
mas sabe que há de vencê-los."

Tem mais aqui e aqui.

26/11/2010

Transcrições II

Também não são meus, mas são. :)

Nas leituras da vida...

"Especialistas são pessoas que sabem cada vez mais sobre cada vez menos até saberem tudo sobre nada."

"Várias das grandes ruínas que hoje decoram os desertos e as florestas são monumentos às armadilhas do progresso, lápides de civilizações que se converteram em vítimas de seu sucesso" - Ronald Wright, em "Uma breve história do progresso"

"O pior dos problemas da gente é que ninguém tem nada com isso" - Mario Quintana

"- Qual é sua medida de tempo preferida?
- Não entendi.
- A medida de tempo. Qual você prefere?
- Os lustres.
- Lustres?
- Sim, a cada cinco anos. E você?
- Às vezes.
- Às vezes é lustres? [não achei "lustres" no dicionário]
- Não, às vezes. É a minha medida de tempo preferida." - Diálogo em O abraço partido, filme argentino


"Estela era um túnel que desembocava na minha morte (...) Agora percebo que vou morrer e ela não estará fazendo cafuné na minha cabeça." - O abraço partido, filme argentino


"A menina escreveu um conto. 'Mas seria muito melhor se você escrevesse um romance', disse a mãe. A menina construiu uma casinha de boneca. 'Seria muito melhor se fosse uma casa de verdade', disse a mãe. A menina fez um pequeno travesseiro para o pai. 'Seria mais útil se fosse uma colcha', disse a mãe. A menina cavou um buraquinho no jardim. 'Seria muito melhor se tivesse cavado um buraco grande', disse a mãe. A menina cavou um buraco grande e foi dormir dentro dele. 'Seria muito melhor se você dormisse para sempre', disse a mãe." - A mãe, de Lydia Daris, saiu na Piauí


A insustentável leveza do ser
Milan Kundera

"Eu poderia dizer que a vertigem é a embriaguez causada pela nossa própria fraqueza, mas não queremos resistir a ela e nos abandonar. Embriagamo-nos com nossa própria fraqueza; queremos desabafar em plena rua, à vista de todos, queremos estar no chão, ainda mais baixo que o chão!!"

"Não encontro outra explicação senão a de que o amor não era para ele, o prolongamento, mas sim a antítese de sua vida pública. O amor era para ele o desejo de se entregar às vontades e caprichos do outro. Aquele que se entrega ao outro como um prisioneiro de guerra deve antes entregar todas as armas. Vendo-se sem defesa, não pode deixar de se indagar quando virá o golpe. Posso, portanto, dizer que o amor era para Franz a espera contínua do golpe que iria atingi-lo."

"Enquanto as pessoas são ainda mais ou menos jovens e a partitura de suas vidas está somente nos primeiros compassos, elas podem fazer juntas a composição e trocar os temas. Mas quando se encontram numa idade mais madura, suas partituras musicais estão mais ou menos terminadas, e cada palavra, cada objeto, significa algo de diferente na partitura do outro."


Cama de gato - filme

"O capitalismo é autofágico."

"As pessoas vão ver que é pior ter todo o espaço do mundo para se expressar e porra nenhuma para dizer."

Transcrições

Não são meus, mas me pertecem.
Enjoy!

O homem sem qualidade
Robert Musil

"Afinal, a Terra não é velha, e aparentemente nunca foi muito abençoada."

"O homem precisa ser limitado em todas as suas possibilidades, planos e sentimentos, por preconceitos, tradições, dificuldades e limitações de toda sorte, como um louco na sua camisa-de-força; e só então aquilo que tem a produzir talvez tenha valor e coerência e solidez; na verdade, é difícil perceber o alcance dessa ideia!"

"A humanidade produz bíblias e armas, tuberculose e tuberculina."

"Perguntas e respostas articulam-se como peças de máquinas, cada pessoa tem apenas tarefas bem determinadas, as profissões estão agrupadas em lugares certos, come-se em pleno movimento, as diversões estão reunidas noutras partes da cidade, e em outros locais encontram-se as torres onde ficam esposas, família, gramofone e alma."

"Não há melhor exemplo de fatalidade do que um jovem que se acomoda dentro dos limites de um velho comum; e isso sem golpe do destino, apenas por um processo de encolhimento ao qual estava predestinado!"

"Poder renunciar a algo que nos faz mal é prova de força vital! As coisas perniciosas atraem os exaustos! O que você acha? Nietzsche afirma que é sinal de fraqueza um artista se ocupar demais com a moral de sua arte."


A arte de ser infeliz (ou a auto-ajuda ao contrário, por minha conta)
Paul Watzlawick

"Nosso mundo, ameaçado de afundar numa onda de conselhos e receitas sobre como ser feliz, não pode ficar privado de uma bóia de salvação para aqueles que procuram a infelicidade."

"Ducunt fata volentem, nolentem trahunt - o destino conduz a quem consente, a quem resiste ele o arrasta." [bobagem]

25/11/2010

Escritos antigos - se eu fosse atriz...

Ficção - 3/4 de mentira

Não falo que fiz papel... (de idiota. Mas eu acho engraçado o que eu direi.)

"O teatro"

Para mim é tudo prosa. (e tudo sonho)

Ia fazer uma peça de Shakespeare (me incomoda conhecer Shakespeare aos 11 anos). Peguei minha fantasia e fui ao teatro. [e tudo isso é mentira, agora é só prosa] ! Lá encontrei vários amigos, ensaiei, tirei 10 (no sonho). No ensaio, chegou a hora - fiquei com medo, pois nunca tinha apresentado em um Teatro Municipal (dê-me licença para eu gargalhar, hahahahha. O que eu queria fazer com esse diário??? Todo ano ia ao teatro para dançar ou tocar flauta, e cantei no Municipal de SP, Campinas, sob a regência de Benito Juarez...). Fiquei envergonhada, então o professor disse "Se não for vc, colocarei outro no lugar". Como assim?? "Chegou a hora?". Ninguém pode me substituir (no quê?). Ninguém. E eu entrei. (tudo isso ficção, no sonho) Entrei, disse minha fala e o tempo foi passsando, horas, e o público, gostando, aplaudindo.

Agora, acorda!

Saindo do sonho, Carmina (na vida real, no coral em que cantava, digo) é foda. E tenho a honra de ter participado do coral aqui no Municipal de SP e em Campinas tb. "Oh, oh, oh, totus floreo, iam amore virginali totus ardeo". E se você gosta de música boa, vai assistir ao vídeo aqui debaixo até o final.



Chegou a hora da última fala (do sonho):

"Ser ou não ser?"

"Você é quem decide".

Acho que eu era muito mais importante na vida real, em Carmina Burana.

Escritos antigos: eu tinha bom humor

1992 - 5ª série - 11 anos - como se fosse alguém (editei alguma coisa)... Know what? Vou esquecer as regras gramaticais, como começar a frase com "me" ou "se". Sabe o que é mais incrível? Eu achei essa madrugada superplus, mas não tinha a ver.

Uma grande madrugada

Eu acordei às 4h da manhã.
Me (sic) espreguicei e virei para ver a janela.
Levantei e abri a porta do meu quarto.
Puxei de lado meu tênis que estava na frente da porta
Fechei a porta, cocei a cabeça e pensei onde era banheiro.
Apertei a luz do corredor.
Voltei para o quarto, passou a vontade
Abri e porta e entrei:
Sentei-me na cama, me estiquei.
Ergui o cobertor e o coloquei sobre mim
Chutei o gato que subiu em cima da cama
Enrolei-me no cobertor
Alisei o gato

escritos nada antigos

Quando estava no 1º colegial, 1996, o professor nos deu esse texto do Dalton Trevisan. Chama "Ezequiel", e parece, segundo meu xerox, estar no livro ou coletânea Desastres do Amor.

"(...) Minha tia não o queria porque era um homem feio e além disso sem profissão. Eu fiquei gostando dele porque levava um rádio e deixava-o lá em casa por algum tempo.

Certo dia, ele apareceu com um auto e disse a meus pais que queria passear com meu irmãozinho. Meus pais deixaram. Eu fui na frente com ele, meu irmão atrás. Ele nos levou a uma rua deserta e parou a lata velha, que é como dizem para certo tipo de carro. Ele pediu a meu irmão que se deitasse porque outro homem ia passar por ali. O outro homem não gostava de criança. Com uma voz que eu não sabia se era dele ou de outro homem, perguntou qual era meu nome, Joana eu disse, quantos anos você tem, oito anos eu disse, você quer uma boneca de cachinho, quero eu disse, e ele me prometeu todas as bonecas de cachinho se eu não gritasse. Depois já estávamos de volta para casa."

Acho que meus professores da escola curtiam Dalton Trevisan, li muito - foram seis anos em colégio jesuíta. Ele não era pessoa pública, nunca foi. Meio errado, meio vampiro, arreio, mais ainda que Chico Buarque (herói da minha infância). Veja você... Não sei de quem gosto mais. Tenho um pouco (ou muito) de Dalton: talvez seja menos reclusa, mas a visão que ele tem da gente curitibana é igual à minha. Não sou de lá, mas vivi lá, né? Há pessoas que amo em Ctba, e amo de verdade; são poucas e boas.



Mais 1992, 1o-11 anos, 5ª série

Vou escrever algo nada a ver com o Dalton. Acabo de ler meus arquivos. E, apesar de ter 18 anos a menos naquela época (29-18=11) , e ter usado o nome da minha melhor amiga da época na redação, e nunca ter tido irmão de verdade (a amiga Mari era mesmo melhor melhor, e se eu a vir hoje, continua sendo), isso veio me fazer escrever, 10 anos depois, com muita vontade. Medo! Ou não?

5ª série B, Anglo, Piracicaba, 10 ou 11 anos (com [muitas e boas, mas sinceras - "lhes" e "se" e tals é por conta da 5ª série] adaptações).

Quando você vê o final, não acredita que seria tão igual ao que escreveu. Eu escrevi isso numa cartilha em 1992 (10-11 anos), sério!!!. Está no meu colo agora. E quando falo com o leitor, não tinha lido Machado de Assis ainda, digressões, muito menos podia esperar que minha mãe morreria.

"Mariana estava correndo e tropeçou no skate do irmão, caiu no chão e rasgou a calça nos joelhos. Gritou para a mãe e chorou. A mãe pegou gelo no congelador para passar no joelho da filha, consolou Mariana. Estava doendo muito. Mariana sorriu para ela e despediu-se porque a mãe iria viajar para trabalhar, e agradeceu por ajudá-la a passar a dor. A mãe de Mariana foi embora e a garota ficou com saudades.

A mãe, no carro, pensou: "Que bonito o ato de Mariana ter vindo correndo só para dizer um 'tchau'. E acabou acontecendo isso (a queda). Eu amo a minha filha".

Querido leitor, as pessoas, às vezes [com crase mesmo], se prejudicam para dizer um 'tchau' para a pessoa que gosta, isto prova que essa pessoa, como Mariana, se prejudicou para querer dizer um 'tchau' para a pessoa que ela ama, a MÃE.

MÃE: palavra pequena.

GRANDE significado."

Esse texto pode parecer um sentimentalismo barato. Mas eu tenho o caderno da sei-lá-que-série [quinta], aqui no meu colo, com esse texto escrito à mão, inclusive sobre a falta da minha mãe. Eu falava com meu interlocultor, que nunca falou comigo.

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Da série: Escritos antigos de 1989/91

Redação para o Dia das Mães (adoooro!!), maio de 1989 (7 anos)

Dia da Mamãe

Minha mãe é bonita, legal e bondosa.
Ela tem olhos castanhos, cabelos meio vermelhos, meio alta, um pouco branca e com muita sarna.
Minha mãe gosta de sopa, batatinha frita, salada de alface tomate e pipino, arroz e feijão.
Ela gosta de ficar lendo livro com a televisão ligada.
A parte da casa que ela mais gosta é o quarto.

(sic)

PS.: Cabelos "meio vermelhos"? Ela tinha cabelos vermelhaços, ferrugem, ninguém tinha dúvida de que era ruiva. "Um pouco" branca? Muito branca. Alva. "meio alta"?? Hahaha. 1,57m e meio, como ela dizia.
PS.2: Sarna??? WTF?? Sardas, como a professora Carolina, da 2ª série A, bem me corrigiu.
PS.3: pEpino.



Redação: "Meu brinquedo preferido", 1991, 4ª série A, professora Chenorik (10 anos - pensava que podia escrever diferente dos outros...)

Meu brinquedo preferido é brincar com a alegria, é passear no bosque, na praia, na floresta, em qualquer lugar, mas sempre com amor. [Obs. da profª.: Que bom!]
Meu brinquedo preferido é ter amigos, amizade, e sentir amor ao próximo.
Meu pior brinquedo é o ódio, a maldade, a raiva, tudo o que nos atinge, nos fazendo mau.
Meu brinquedo preferido é estudar e tirar boa nota na prova. [Obs. da profª.: Maravilha!! Estudar e conhecer é muito interessante].
Meu brinquedo que eu mais gostava era brincar no parquinho, de boneca, com meus primos que eu mais gosto, que eu mais amo.
Ainda eu adoro brincar, fazer tudo de bom para meus primos.
Eu não gosto de ler, só leio de vez em quando, mas sei que uma das melhores brincadeiras, uma das melhores coisas de se fazer quando está só: é ler um "livro".

Comentário da professora Cheno:
Laura, você não terá nota máxima simplesmente porque não respeitou os parágrafos (alinhamento), o que a tia Cheno alertou bastante!! Você escreve muito bem e tem ótimo coração!

(sic)

PS.: Por que não falar de brinquedo físico, né? Ah, canceriana...
Ps.2: Se a redação é brinquedo preferido, por que falar do pior brinquedo? Eu-sou-do-contra.
PS.3: Será que a catequese me influenciou tanto para me fazer uma pré-adolescente que ama tanto o próximo?
PS.4: Sentia-me tão adulta que tinha que dizer que gostaVA de brincar de boneca e com os primos?
PS.5: Minha mãe deve ter tido uma síncope ao ler que eu não gostava de ler. Fora que eu escrevo "livro" no fim. WTF aspas?
PS.6: Adorei o comentário da tia Cheno. Eu só pulava a linha para começar o parágrafo, não deixava o espaço antes do texto, o que, normalmente, naquela época, teria que fazer. O legal é que na internet não tem mais essa de espaço do parágrafo, né? É tudo JUSTIFICADO.

24/11/2010

Da série: Escritos antigos sob crítica

Adoro a ingenuidade e a credulidade da adolescência


Último parágrafo da resenha de 1998 (quando tinha 17 anos) sobre Morte e vida Severina, de João Cabral de Melo Neto.

Essa peça, com quarenta e quatro anos de idade, ainda é moderna e serve de exemplo para muitos retirantes anônimos da atualidade que vivem em contato com a morte e tentam melhorar suas condições subumanas alargando ainda mais as favelas nas grandes cidades. Será que João Cabral tentou nos avisar?

PS: servem de exemplo ou são exemplo?
PS.2: "da atualidade"? Que horror, Laura.


Resenha do texto "Refém do verde", publicado na Veja em 9 de abril de 1997, de autoria de Franco Iacomini e sobre Guaraqueçaba (PR).

O meio de sobrevivência, segundo
Franco Iacomini, consiste na pesca artesanal e na produção de bananas (o autor se esquece que os bananais não são naturais da mata atlântica, portanto, estando em área de preservação, os bananais estão cada vez mais extintos na região, diminuindo os recursos econômicos da cidade). Porém, pode-se citar mais dois meios de sobrevivência: a produção de palmito, muitas vezes proibida pelo IBAMA, dependendo da idade da árvore, e a Reserva do Boticário, que emprega 20 habitantes.

(...)

O artigo foi bem abrangente, porém, superficial. O jornalista poderia ter falado mais sobre a reserva de Guaraqueçaba, além de entrar mais em detalhes sobre a extensão do município. A localização também deixou a desejar.

[Aí falo onde fica, sua extensão, quando foi fundada, coordenadas...]

Observação do professor:
Laura: Muito bem desenvolvida sua resenha, abordando o assunto inclusive com o próprio conhecimento de quem esteve no local.

Obs.: O autor do artigo da Veja (
Franco Iacomini) foi aluno do Medianeira há uma década!

PS.: Desde pequena criticando os outros...
PS.2: Tomei na cabeça, porque sei que nem sempre é possível escrever tudo o que quer no espaço exíguo dedicado a uma reportagem impressa. Viva a internet!
PS.3: Que diferença faz saber que Guaraqueçaba tem 2 mil km² de extensão? O quanto isso representa é muito mais eficiente. E a localização exata? Só critiquei porque desenhei dois mapas, do litoral paranaense e paulista e um recorte da região de Guaraqueçaba. Foi para me valorizar, óbvio.
PS.2: Nota que me deram: 9,5
PS.2: Que raio de pessoa não falaria da sua experiência pessoal em uma resenha? Tive sorte de ter conhecido Guaraqueçaba antes do professor passar esse trabalho?

Ela

Ela olhou para trás e viu a porta bater. Sentiu como se um fio gelado passasse por dentro de sua espinha; tremeu. Deveria ter olhado pouco antes de ele sair? Como se aquela fosse a última vez? Seria aquela a última vez?

Ela voltou o olhar à revista que estava aberta à sua frente. Meneou a cabeça, sentiu o estômago torcer, a garganta, trancar. Será que ele havia olhado para ela antes de sair? No que ele pensou? Sim, porque ele pensou em alguma coisa. Impossível não pensar...

Ela havia sido fria. Fria, cruel, extremamente desprovida da exaltação que lhe era inerente. Não precisava ser assim, não queria. Mas como iria se defender se não o fizesse? Reagiu mal, bem mal. Sabia disso. Ela só o ignorava porque ele era incapaz de reconhecer sua tristeza, ou de entendê-la.

Ela pensava e lia a revista. As palavras, as linhas, os parágafos, pareciam surgir de acordo com seus pensamentos, como se estes tivessem sido traçados previamente por algum jornalista. Percebeu que não conseguia se concentrar se a cabeça não descansasse. Não fazia ideia do que havia lido nos últimos 20 minutos. Fechou a revista e se levantou.

Ela caminhou. Sentiu os pés descalços no chão de taco, meio geladinho, meio confortante. Como um abraço de verdade, um carinho que relaxa. Recordou-se da última vez em que ele a havia abraçado com força, do último momento em que se sentiu protegida, amada. Foi difícil buscar na lembrança, parece que eles estavam distantes há tanto tempo...

Ela se jogou no sofá e arrumou as almofadas do jeito que fazia todas as vezes que desejava que o mundo a esquecesse. Sentiu que os únicos braços que poderiam ampará-la eram os do sofá. Ali permaneceu, com a cara enfiada na montanha de almofadas. E quase dormiu.

Ela despertou com o barulho da porta se abrindo. Era ele. Voltara com uma garrafa de vinho e o almoço comprado, como combinado. Ela demorou a levantar, ele pensou que estava cansada. Ela não tinha muito apetite, ela achava que estava fazendo regime. Ela não o olhava diretamente, ele achou que era pelos olhos inchados. Ele não perguntou, ela também não. Mesa posta, ela foi comer com a certeza de que algo havia se transformado. Ela.

19/11/2010

Meu mundo em perigo

Passar uns dias num hotelzinho meia bomba no centro para fugir e esquecer os problemas, mesmo sabendo que eles não serão esquecidos. É algo que mais ou menos 99% das pessoas gostariam de fazer. Clicar no "reiniciar", fazer o que o tempo mandar, colocar a cara ao vento livre de preconceitos, fingir ser quem não é ou ser você mesmo com o máximo de autenticidade.

Chorar, gritar, esquecer. Dormir sem hora para acordar. Confiar naquele que mal conhece, esquecer aqueles que te conhecem bem.

Meu mundo em perigo, de José Eduardo Belmonte e que estreia no dia 10 de dezembro, é um pouco isso. É o mesmo diretor de Se nada mais der certo, PUTA filmaço. O novo longa segue a mesma linha "tragédia humana". Não chega a ser superior ao anterior, mas, ainda assim, muito bom.


O enredo dá uma forçadinha, mas é tudo muito bem feito, pensado. As falas são densas, cheias de significados. A trilha se mistura aos diálogos, a película, a retratos. A concepção estética casa ao tormento das personagens, nada é muito colorido, apenas as lembranças – saturadas. É tudo muito dolorido, sofrido. As lágrimas são de desespero, um pedido de socorro.

É a história de um homem perturbado, que acaba de perder a guarda do filho e atropela e mata um sujeito. O homem, Elias, é um fotógrafo (Eucir de Souza). A vítima, pai de Fito (Milhem Cortaz), que fica inconsolável e jura vingança. As atuações são ótimas.

Meu mundo em perigo ganhou os prêmios de Melhor Filme segundo a Crítica e Melhor Ator no Festival de Brasília de 2007. Demorou, mas agora ele veio.

18/11/2010

Jesus me abane!!

É foda quando você tem um blog e as pessoas que mais chegam nele estão procurando por "Casas da Banha" e "monstro do lago Ness".


Frustacías.

Combo 3-D, não!

Eu recebo várias promoções no meu email do Hotmail. Americanas, Submarino, Fast Shop, Livraria Cultura... um sem fim de malas diretas contemporâneas-virtuais. A Fast Shop anda me enviando promos espetaculares de combos: TV 3-D + PlayStation + kit 3-D: transmissor, óculos 3-D, jogos e filme Blu-Ray.

Fast Shop, querida, eu não me dou bem com 3-D (dá uma lida nisso aqui. Minha experiência com Avatar não foi nem um pouco boa). Me dá arrepios, revertério e vertigem só de pensar. E você já me mandou trocentos emails com o mesmo pacote! E, se as opções entre 40 ou 46 polegadas parecem interessantes (R$ 7,2 mil ou R$ 9 mil), só parecem interessantes a outros clientes. TejE ciente que na minha casa não cabe uma TV maior que 32 polegadas. Quer me vender algo realmente bom? Faça uma promoção de 32', sem 3-D e sem nada dessas outras coisas. E de microondas pequeno. E de DVD player.

Além disso, eu sou péssima no PS. Tosca. O controle não me entende e eu não entendo ele. Adoro ver os outros matando no GTA, mas eu não sou boa aluna. No Wii eu me saio um pouco menos pior.

Capisce?

11/11/2010

Preguiça mental

Estou passando por um momento de preguiça mental. Não consigo ser criativa, não consigo prestar atenção, por isso, nem ter concentração. Li, há alguns dias, parte do meu TCC - Trabalho de Conclusão de Curso, da faculdade. É um perfil do artista plástico Newton Mesquita. Fiquei feliz em ter feito alguma coisa decente no passado, mas muito mais infeliz em não fazer mais algo tão dedicado. Assim, qualquer produção se torna medíocre.

Demorei uns dois anos e meio para decidir qual seria o tema do meu TCC. Isso atrasou minha formatura, obviamente, em dois anos e meio. Foi uma decisão árdua, já que não queria terminar a faculdade com um trabalho meia boca. E decidi. Foram meses de visita à casa dele, de entrevistas com muitos que fizeram parte de sua vida... E mais um mês, "férias", para escrever. Eu queria tanto ter tempo para fazer tudo isso de novo! Não que o TCC não tenha defeitos, mas foi feito com muito suor e com toda a minha alma.

Entrar na vida das pessoas é muito complicado, mas muito bonito. Não gosto do jornalismo que se apodera de instantes da vida sagrada de pessoas e depois sai sem dizer tchau. Gosto do que faz sentido também para a pessoa, do que a faz se sentir orgulhosa em participar do seu trabalho. Tem gente que fala que jornalista é urubu, que gosta de sangue e morte. Mas, às vezes, eu acho que está mais para sangue-suga. Você vai lá, invade a privacidade dos outros, faz seu trabalho, ganha seu dinheiro, e vai embora.

Não. Quero que a pessoa se sinta parte realmente importante do meu trabalho, como espero que Newton sinta. Não quero invadir, quero me sentir valiosa para que a pessoa fale o que quer, não o que sinta num momento de fragilidade, tristeza ou sofrimento.

Fazer perfis será uma solução? Dedicar-me a eles com devoção será a que realmente presto nessa vida? Não sei. Mas queria tentar.